sábado, 16 de outubro de 2010

"CAZUZA"


Desde sua morte, em decorrência da aids, foram lançadas 22 coletâneas, mais que o dobro do que Cazuza gravou em vida. Foram cinco discos como vocalista do Barão Vermelho e mais cinco em carreira solo. Biografado em 1997 por sua mãe, Lucinha Araújo, e tema do filme de Sandra Werneck em 2004, Cazuza é ainda um dos mais presentes artistas da música brasileira. Este ano, em seu novo disco, Lobão reviveu Cazuza na parceria inédita dos dois, Seda.

A carreira começou logo no começo dos anos 80. "Aos 17 anos, comecei a descobrir que minhas poesias podiam ser letras de músicas, mas só assumi isso aos 23 anos, quando entrei no Barão Vermelho", definiu ele. Durante o ensaios de uma peça no Circo Voador, Cazuza conheceu Léo Jaime, que contou-lhe sobre uma banda que procurava um vocalista: era o Barão Vermelho. "Fui, no dia seguinte, ao encontro deles e minha história começou."

Ser filho do presidente da Som Livre não significou abrir as portas do sucesso para Cazuza. "Meu pai não aceitou a idéia facilmente. Foi todo o tempo contra. Acreditava que a crítica iria me crucificar e a coisa ficaria parecendo um lance de puxa-saquismo, de proteção ao filhinho do patrão", explicou, anos depois.

Comercialmente, o primeiro disco, lançado em 1982, não foi um sucesso. Mas Caetano Veloso incluiu no repertório de seu show uma faixa do álbum, Todo Amor Que Houver Nesta Vida. Já o segundo álbum, de 1983, começou a colocar o Barão Vermelho mais em destaque com Pro Dia Nascer Feliz. A consagração viria em 1984, com o quarto álbum, Maior Abandonado, que rendeu ao grupo o primeiro disco de ouro.

Em julho de 1985, quando o material para um novo disco já estava selecionado, a notícia chegou aos jornais: enquanto os outros seguiriam com a banda, sua estrela partiria para a carreira solo. Poucos dias depois, Cazuza foi internado com febre alta e infecção bacteriana. Um teste de HIV feito na ocasião apresentou resultado negativo.

Seu primeiro álbum solo, Exagerado, chegou às lojas ainda em 1985 e apresentou um lado mais sereno de Cazuza. A veia roqueira do cantor ainda mostrava-se presentes em algumas parcerias, mas o sucesso ficou mesmo com as baladas do disco, como Codinome Beija-Flor.

O novo disco sairia apenas em 1987, sob o titulo de Só Se For A Dois. Dias antes de estrear o show, ele adoeceu e fez um novo exame de HIV. A confirmação da presença do vírus iria transformar sua vida e sua carreira. Em outubro de 1987, após uma internação numa clínica do Rio, Cazuza foi levado pelos pais para Boston, nos Estados Unidos. Lá passou quase dois meses críticos, submetendo-se a um tratamento com AZT.

Ao voltar ao Brasil, gravou Ideologia, no início de 1988 - um ano marcado pela estabilização de seu estado de saúde e pela sua definitiva consagração artística.

O disco vendeu meio milhão de cópias. Na contracapa, um Cazuza mais magro por causa da doença, com um lenço disfarçando a perda de cabelo em função do coquetel de remédios. No seu conteúdo, um conjunto denso de canções expressou o processo de maturação do artista.

Letras como "Eu vi a cara da morte/E ela estava viva", da faixa Boas Novas, indicavam o estado de espírito que a aids dera a Cazuza. A serenidade do início da carreira solo então conflitava com certa revolta. Em certo show no Canecão, ainda em 88, ele cuspiu na bandeira brasileira que foi atirada ao palco por um fã. Por outro lado, procurava manter uma postura mais comedida em seus shows. Bem diferente do Cazuza elétrico e catártico do Barão Vermelho.

No início de 1989, o artista lançou Cazuza Ao Vivo - O Tempo Não Pára. Na época, a gravadora Polygram contabilizou cerca de 560 mil cópias vendidas. O disco reunia os maiores sucessos do artista, mas trazia também duas músicas novas que estouraram: Vida Louca Vida, de Lobão, e O Tempo Não Pára, do próprio Cazuza. A letra fala de sua condição individual, de quem lutava para se manter vivo.

Pouco depois do lançamento do álbum, Cazuza admitiu publicamente que estava com aids. Foi um dos primeiro artistas brasileiro a admitir publicamente a doença.

A morte iminente afundou Cazuza num processo de trabalho compulsivo. Ele compôs letras e canções que culminaram em um álbum duplo, Burguesia, lançado ainda em 1989. Em seu último suspiro musical, Cazuza saudou sua própria carreira: o lado rebelde no disco um, mais roqueiro, e sua faceta serena no disco dois, mais MPB.

Anos depois, Lucinha Araújo contou que Cazuza gravou o disco já preso a uma cadeira de rodas. Em outubro de 1989, depois de quatro meses seguindo um tratamento alternativo em São Paulo, Cazuza viajou novamente para Boston, onde ficou internado até março do ano seguinte. Seu estado já era muito delicado e, àquela altura, não havia muito mais o que fazer. O enterro aconteceu no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.

Nasceu Agenor de Miranda Araújo Neto, no dia 4 de abril de 1958. Morreu apenas Cazuza, no dia 7 de julho de 1990. Mas ele não é apenas um astro morto precocemente. A cada dia Cazuza torna-se mais e mais um ícone de uma geração que insiste em chamá-lo de poeta. Mas ele gostava mais de ser chamado de roqueiro.

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